“Senhor, sê misericordioso comigo e com ela e concede-nos que cheguemos, juntos a uma idade avançada” Livro de Tobias 8, 7 A luta pela manutenção de sua família, a defesa de seu lar em sua pátria, o amor apaixonado por sua gente, sua bandeira e seus valores conduzem o militar a obedecer às ordens emanadas pela autoridade competente, em estado perene de vigilância e prontidão, o que exige, desde a raiz da própria identidade vocacional, a disponibilidade integral e a tensão permanente, quer sobre o corpo, quer sobre a alma, seja para a paz, seja para a guerra.
Essa moldura delineia inevitavelmente o constante risco e a intensa pressão na consecução dos objetivos de cada missão. Esses, uma vez alcançados, franqueiam ao bom soldado o justo repouso e merecido conforto humano, na simplicidade de seu modesto lar, ao lado de entes queridos e de amigos leais. Como salutares efeitos deste bem-estar programado recolhem-se: a ampliação da operacionalidade da Força, o reequilíbrio emocional do indivíduo e sua parentela, a humanização das relações da caserna e a manutenção da saúde mental dos combatentes; razões pelas quais o descanso do militar, efetivado em períodos regulamentares de férias, recessos, licenciamentos ou dispensas, revela-se, ao longo da carreira, como um dom precioso, desejável, justo e frutífero. É assim que o condor retorna ao seu ninho, a águia reencontra sua fenda na rocha, o soldado reintegra-se também com a própria paz interior. Não à toa, o ser humano foi criado precisamente no meio de um simbólico jardim paradisíaco, ocupado ora como lugar de trabalho exigente, ora como estância de ócio criativo e aprazível, cuja origem remonta à própria vontade do Sumo Deus Criador.
Nesse contexto, o militar brasileiro há de reconhecer sempre o momento favorável de seu descanso doméstico para valorizar e exaltar aquela que é a razão humana de suas jornadas, a motivação afetiva de sua carreira e o apoio seguro de suas emoções, a sua amada “Maria Rosa”! Como não consagrar a maior parte de seus dias de placidez e quietação à companhia de sua “paloma blanca”, que ele chama carinhosamente de “minha esposa” , “minha mulher”. O fato de escolher estar ao lado dela, de corpo e alma, consagrando-lhe, em ternos diálogos, momentos novos e eivados de surpresas emocionais, renovadoras de seu amor matrimonial casto, vibrante e sadio, tem sido a principal motivação pela qual, desde os tempos bíblicos, até o mais humilde dos soldados era pormenorizadamente amparado pela Lei de Moisés.
O Livro do Deuteronômio registra claras prescrições para o ordenamento matrimonial, antes mesmo de o israelita combatente reassumir suas pelejas, em sucessivas batalhas: “Quando um homem se tiver casado recentemente, não irá à guerra e não se lhe imporá cargo algum. Durante um ano, estará livremente em seu lar para tornar feliz a mulher que ele desposou” (Dt 24,5). Face a direitos e deveres esponsais biblicamente garantidos, os tempos passaram e as mentalidades evoluíram, mas a raiz metafísica do estado civil “casado”, todavia, amplia-se, em nossos tempos, com profundidades, larguras e alturas inauditas, de forma que tratar a mulher, como merece e deve ser tratada, supõe hoje novas habilidades, bem distintas de outras épocas sociais e de antigos costumes.
Atualmente, ser militar casado e considerar a esposa de forma condigna, segundo o direito e conforme o pundonor militar, exige dele as virtudes características dos varões mais exemplares da história régia e militar, com acréscimos de deferência pela livre autonomia social da esposa,bem como de fascinação por seus talentos ampliados.
“De todos os remédios caseiros, uma boa esposa é o melhor”1 , dizia o filósofo e poeta americano Elbert Hubbard. Sim, o papel da mulher do militar na vida social vai muito além de ser exibida como troféu por parte de uns ou disfarce psicológico para a boa imagem narcisista por parte de outros. A esposa virtuosa, influencer do próprio lar, permanece como baluarte da esperança da melhoria do mundo e o principal remédio contra os males da sociedade contemporânea. Por isso, a digna esposa do militar jamais poderá se tornar alvo de agressões verbais ou de violência doméstica, nem ser submetida à escravidão ou às migalhas afetivas, nem tampouco considerada mera articuladora política das futuras patentes do marido no meio castrense.
Artur da Távola chega a descrever, com perfeição literária em página poética de rara beleza, a responsabilidade da mulher que realmente sabe amar: “É mestra do homem; jamais governanta dele; ela não irrompe, nem interrompe… é suave; sabe ser mãe e também ser paixão; jamais se deixa subjugar, tampouco subjuga; acolhe os filhos e ensina amor ao marido; sabe tanto de moda, quanto de arte; educa sem reprimir e orienta sem impor; e não se entrega a exageros, mas conversa com Deus e partilha seu coração dialogal com sua amada família.” Hoje, ao chegar em casa e constatar, uma vez mais, que recebeu de Deus a dádiva de uma mulher forte, cada militar deveria recitar em altas vozes a mesma oração de Tobias, em noite de núpcias: “Senhor, sê misericordioso comigo e com ela e concede-nos que cheguemos, juntos, a uma idade avançada” (Tb 8, 7).
Poderia talvez repetir as eloquentes palavras sugeridas pelo grande bispo e doutor da Igreja, São João Crisóstomo, de Constantinopla (347- 407), o maior pregador do Império romano do Oriente: (Ó esposa amada) “Tomei-te em meus braços, amo-te, prefiro-te à minha própria vida. Porque a vida presente não é nada sem ti, e o meu sonho mais ardente é passá-la contigo, de maneira que estejamos certos de não sermos separados na vida futura que nos está reservada. Ponho teu amor acima do mundo, e nada me seria mais penoso que não ter contigo os mesmos pensamentos…” Sim, o Brasil e o Exército Brasileiro agradecem a presença, a sensibilidade e, sobretudo, a atuação heroica da esposa de cada Soldado de Caxias, na sagrada guarnição de seu lar. Muito obrigado! Deus lhes recompense!
Que o Cristo Jesus, Esposo divino de sua única e fiel Esposa, a Igreja por Ele mesmo fundada, abençoe generosamente as esposas da família militar brasileira, cumulando-as de castas virtudes, vitórias alegres e belezas espirituais fascinantes. Assim seja.
DEUS SEJA LOUVADO
Padre Uyrajá LUCAS Mota Diniz – Maj QCM SAREx Capelão da Academia Militar das Agulhas Negras.
1 Elbert Green Hubbard (1856-1915), famoso por ser o autor do ensaio “Mensagem para Garcia”, faleceu ao lado de sua esposa, Alice Moore Hubbard, a bordo do RMS Lusitania, quando este foi afundado por um submarino alemão, na costa da Irlanda, em 7 de maio de 1915, na alvorada sombria da Primeira Guerra Mundial.
Leia a notícia na fonte: Academia Militar das Agulhas Negras
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